Como bom ouvinte de música pop, 2014 foi um ano pra se deleitar com muitos lançamentos que se provaram icônicos de lá pra cá. Carreiras inteiras foram produzidas, garantidas e até salvas durante aquele ano. Ariana Grande é um grande exemplo disso, com o seu segundo álbum, “My Everything”. Ela saiu de uma coadjuvante da Nickelodeon para a maior hitmaker de 2014, com 4 hits no top 10 dos Estados Unidos e outros países. Um desses hits foi “Love Me Harder”, colaboração da cantora com The Weeknd, cantor canadense que faz parte da mesma gravadora de Ariana, mas em parceria com a sua própria gravadora. A figura do cantor, até então, parecia bem excêntrica para os admiradores de pop, principalmente ao lado de Ariana, que começava, timidamente, a flertar com uma imagem mais madura. Mas o que ninguém esperava é que 2015 fosse de Abel, nome de batismo do artista.
Era já o seu segundo álbum, mas o primeiro lançamento com holofotes mundiais para The Weeknd. Dele, o cantor conseguiu dois hits em 1º lugar nos Estados Unidos, inclusive com uma música substituindo a outra no topo dos charts americanos. Um trabalho consistente, reconhecido pelo público e por várias premiações, inclusive o Grammy. Aliás, o ponto principal desse texto é reconhecer a consistência do trabalho de Weeknd e o quanto cada novo trabalho lançado por ele impacta o cenário musical. Para muitos, pode parecer precipitação anunciar The Weeknd como um ícone da música, mas sinceramente? Tá demorando. Prova disso é o que aconteceu nessa semana.
Domingo à noite, “Blinding Lights”, lançada ao final de 2019, ainda em tempos sem pandemia, música número 1 do ano de 2020, voltou ao topo do iTunes dos Estados Unidos. Isso poderia significar qualquer coisa, mas Weeknd também é o artista mais ouvido do mundo no Spotify no momento exato que escrevo esse texto. Ele também estará no show do intervalo do Super Bowl, talvez o espaço mais desejado e assistido do mundo. Tudo isso acontece em um momento extremamente questionável em relação à premiação mais esperada e de maior relevância da música. Mesmo com hits, um trabalho visual impecável e a longevidade de suas músicas, o último trabalho de Abel não recebeu nenhuma indicação ao Grammy.
Esse questionamento sempre vai existir mesmo com qualquer desculpa que encontrem pra justificar a ausência do maior hit do ano e de um dos maiores álbuns de 2020. Acredito que o pensamento convencional sempre me leva a pensar no esforço que artistas pretos precisam ter para serem reconhecidos de maneira, no mínimo, igual a artistas brancos. Como alguém que sempre acompanha Beyoncé, é inevitável perceber que ela não tem o mesmo número de hits em primeiro lugar que outras artistas brancas, mas ela conseguiu algo muito maior que isso. Talvez, esse seja o caminho para The Weeknd. Ele não é mais alguém que te faz lembrar Michael Jackson ou que se “limitou” a colocar o R&B em um novo ambiente e com novo peso. Ele ultrapassou todas as expectativas que você pudesse ter, mesmo as mais óbvias.
Do R&B para o disco, sempre com um pé no trap e chegando ao pop, Abel revoluciona o mercado a cada lançamento e sempre vai te dar aquilo que você não sabia que precisava. Provavelmente muita gente se arrependa de não entender isso, até as premiações que o ignoraram ou o mantiveram numa caixinha nessa temporada. Mas a busca incansável de ser um artista reconhecido muito mais pela excelência de seu trabalho que pela mídia que seu nome causa tem um certo preço e é bem óbvio que The Weeknd está disposto a continuar pagando. Pagando, para colher muito mais no futuro.
Gabriel Bueno é publicitário de formação, atua no mercado desde 2013 nas áreas de criação, mídia e produção. Viciado em acompanhar música, sempre disposto a comentar premiações, álbuns, videoclipes e tudo que envolve o meio musical. É o autor da coluna Decifrando, publicada no TV Pop nas manhãs de quarta-feira. Siga o colunista no Twitter: @GabrielGBueno_. Leia aqui o histórico do colunista no site.