Há quase uma década na Globo de Brasília, Gabriel Luiz se despedirá da emissora neste sábado (11): o jornalista, que virou notícia nacionalmente ao ser esfaqueado em abril de 2022, optou por largar o telejornalismo para assumir a vaga de assessor do senador Fabiano Contarato, do PT do Espírito Santo. Há quase 10 anos na emissora, o repórter estava incomodado com a ausência de perspectivas de crescimento no canal, além do salário baixo pago pela empresa. Em seu novo emprego, ele ganhará consideravelmente mais do que na televisão.
Nos bastidores, não era segredo que o jornalista sonhava em ter uma rotina mais leve depois de ter se tornado notícia há dois anos. Apesar de ter voltado para a cobertura de temas factuais, ele fez um acordo com a chefia da emissora para não ser escalado para reportagens na editoria policial. Nos últimos meses, segundo apurou o TV Pop, ele passou a sinalizar que planejava se transferir definitivamente para algo mais leve, em uma híbrido entre jornalismo e entretenimento. O repórter emplacou uma produção especial, mas a rede não tinha espaço para uma linha fixa do gênero.
Antes de sua saída, Gabriel Luiz acabou ganhando uma chance como apresentador de um especial ao sábado. No documentário A Outra Brasília, exibido no final de abril, ele contou a história de uma cidade no interior de Minas Gerais que teve que trocar de nome para que Brasília (a do Distrito Federal) se transformasse na capital do país — a produção foi uma ideia do próprio jornalista. O sinal verde para que o projeto foi um sinal de prestígio internamente, já que produções do gênero são constantemente aproveitadas pela Globo nacional.
Ele, no entanto, já havia tomado sua decisão. O seu pedido de demissão já era comentado na Globo de Brasília há várias semanas, mas foi oficializado nesta quinta-feira (9), em um longo texto de despedida enviado por ele aos seus colegas de trabalho. A reportagem do TV Pop teve acesso ao conteúdo da mensagem de despedida de Gabriel Luiz. Confira a íntegra:
Eu sou típica cria da Globo. Aqui eu cresci e aprendi, com os melhores, a fazer jornalismo. Dez anos atrás, cheguei como um jovem cheio de sonhos. E sou feliz em dizer que realizei a grande maioria deles.
Criei vínculos, laços com pessoas competentes e queridas. Fiz todo tipo de matéria, denúncia, programa, especial. Conheci gente, lugares, e entrevistei pessoas que jamais imaginaria conhecer.
Ao lado de tantos profissionais que sempre me inspiraram, aqui também pude me descobrir, encontrando o meu próprio jeito de contar histórias. Desde o começo, apostaram em mim, e sou muito grato.
Em um determinado momento, acabei virando notícia. Muitos ainda me perguntam se estou bem. Eu estou bem! Recebi o melhor apoio que alguém poderia ter recebido por parte da empresa e da direção. E quero agradecer a cada um de vocês pela torcida e pelo carinho.
Vou porque tenho alma cigana. Eu não me reconheço se eu não caminhar. Mas vou leve, com sensação de dever cumprido e muito orgulhoso do que concretizei.
Obrigado por tantos ensinamentos. Obrigado por tantos momentos de risada, emoção, adrenalina e parceria.
Podem contar comigo.
Salve a força de cada um de vocês!
Procurado pela reportagem para falar sobre sua saída da Globo, Gabriel Luiz não quis se manifestar até a publicação deste texto.
Gabriel Luiz virou notícia ao ser esfaqueado
Em 14 de abril de 2022, o agora ex-repórter da Globo levou dez facadas e foi atingido no pescoço, no abdômen, no tórax, na perna, no estômago, no pulmão, no pâncreas e no diafragma, além do braço e do pulso. Depois de passar por cirurgias de emergência no Hospital de Base, o jornalista foi transferido para a UTI do Hospital Brasília no dia 15 de abril, e recebeu alta da unidade médica no dia 6 de maio.
O crime foi cometido por José Felipe Leite Tunholi, de 19 anos, que foi condenado a 23 anos de prisão, e por um adolescente de 17 anos, que está em uma unidade de internação para menores. Os bandidos roubaram o celular e a carteira de Gabriel Luiz, que foram encontrados momentos depois, perto do local do crime. Depois de receber alta e retomar sua vida normal, em julho do mesmo ano, ele compartilhou pela primeira vez a foto de suas cicatrizes, em uma foto publicada ao lado de seu marido, Lucas Machado, e fez um texto falando sobre as marcas que passou a carregar.
“Meu corpo carrega as marcas — visíveis e invisíveis — do que fizeram comigo. Mesmo convivendo em paz com elas, olho pra mim e vejo a violência do que foi e o susto do que poderia ter sido. As cicatrizes, principalmente as mais internas, são um lembrete diário. De esperança, muita gratidão e vida, mas também de indignação, de algo que nunca vai ser normal aceitar e que não deixa de doer. Eu vivo as consequências da inconsequência dos outros”, escreveu o jornalista.
“E pode parecer contraditório, mas depois disso eu precisei confiar ainda mais nos outros. Sei da minha força, mas é nos outros que encontrei o abraço pra me proteger, o apoio pra me levantar. Aprendi que não estou sozinho. Nunca foi só eu comigo mesmo”, finalizou Gabriel Luiz.
