Tiago Eltz continua vivendo um inferno astral na Globo. Rebaixado para a reportagem depois de quase dois anos como âncora da GloboNews, ele quase perdeu seu emprego ao ser flagrado pela diretoria da emissora trocando diárias em um hotel de luxo por jabá nas redes sociais, prática terminantemente vetada pelos princípios editoriais da rede. O jornalista foi repreendido e advertido nesta segunda (22), quando finalmente apagou suas publicações divulgando o estabelecimento. A publicidade, no entanto, ficou no ar durante quase 24 horas, desde o início de domingo (21).
Consultada pelo TV Pop, a Globo disse que “não comenta casos específicos”. A emissora, no entanto, confirmou que a conduta do repórter especial do Jornal Nacional causou uma investigação no departamento de Compliance — leia a íntegra do posicionamento da rede no final deste texto. Eltz, por sua vez, fingiu que nada aconteceu. O jornalista simplesmente apagou seus seis stories divulgando os serviços do Refúgio na Serra Boutique Hotel, localizado na cidade histórica de Mucugê, no interior da Bahia.
O estrago, no entanto, já havia sido feito. A reportagem teve acesso aos conteúdos divulgados pelo apresentador eventual do SPTV e as publicações não deixam dúvidas: as imagens, disponíveis até o início da manhã desta segunda-feira, eram uma publicidade velada ao estabelecimento de luxo. Em suas seis publicações, feitas para mais de 26 mil pessoas no Instagram, o jornalista não poupou detalhes ao exaltar o Refúgio na Serra Boutique Hotel, local cujas diárias podem chegar ao valor de R$ 1.498,00, quantia que representa mais do que um salário mínimo em 2024.
Na primeira publicação, Tiago Eltz falava sobre o restaurante do hotel, pertencente a Ieda de Matos, que trabalha em plataformas rivais da Globo — ela é jurada do Iron Chef Brasil, da Netflix, e faz parte do elenco do canal Sabor & Arte, mantido pelo Grupo Bandeirantes, e André Chequer, uma espécie de chef-celebridade nas redes sociais, muito conhecido na alta sociedade paulistana. Nas imagens seguintes, sempre marcando as páginas do Refúgio na Serra e de seus proprietários (expediente normal em permuta de influenciadores), o jornalista exibia os pratos do local.
Infração de Tiago Eltz já provocou demissões na Globo
A conduta de Tiago Eltz é uma violação explícita aos Princípios Editoriais da Globo. No manual, disponível publicamente no portal G1, a empresa afirma “que é imprescíndivel que o jornalista da Globo evite a percepção de que faz publicidade, mesmo que indiretamente, ao citar ou se associar a nome de hotéis, marcas, empresas, restaurantes, produtos, companhias aéreas” e informa que “o jornalista deve zelar para evitar tais ocorrências”.
A patrulha ao conteúdo das redes sociais dos profissionais do Jornalismo piorou desde dezembro de 2017, quando César Tralli fez fotos divulgando empresas que organizaram o seu casamento com Ticiane Pinheiro. Na época, o então apresentador do SP1 negou categoricamente que tivesse feito jabás para organizar seu matrimônio. Ele também foi poupado de uma sanção mais séria, mas acabou causando um e-mail de Ali Kamel, então diretor-geral de Jornalismo, dando esporro aos seus comandados e vetando, explicitamente, qualquer tipo de publicidade:
De forma certamente não proposital, alguns jornalistas da Globo, em suas redes sociais, têm publicado fotos suas com a marca aparente de algum produto, roupa, restaurante, hotel e afins. Ou, então, permitindo que o espaço para “localização” da foto remeta a alguma marca. Isso leva o público a crer que possa estar diante de publicidade, mesmo que subliminar.
Isso leva o público a crer que possa estar diante de publicidade, mesmo que subliminar.
Marcas, evidentemente, devem ser evitadas. E os nomes de restaurantes e lojas, no espaço dedicado à localização (nas redes sociais), devem ser substituídos pelo nome da cidade em que a foto foi tirada. Isso evitará percepções equivocadas.
Nossos princípios editoriais afirmam que a participação de jornalistas do Grupo Globo em plataformas da internet, como blogs pessoais, redes sociais e sites colaborativos deve levar em conta que os jornalistas são em grande medida responsáveis pela imagem dos veículos para os quais trabalham e, por isso, devem evitar em suas atividades públicas tudo aquilo que possa comprometer a percepção de que exercem a profissão com isenção e correção.
Peço aos diretores e aos editores-chefes que se certifiquem de que esse e-mail chegou a todos.
Quase sete anos já se passaram, mas a Globo continua fazendo vista grossa para profissionais privilegiados pela diretoria que violam suas regras, algo que causa a revolta de diversos jornalistas que já foram impedidos de fazer trabalhos, mesmo que com veiculação restrita, semelhantes aos conteúdos divulgados por Tiago Eltz publicamente. Em julho de 2023, por exemplo, a emissora demitiu uma simples repórter pela violação das regras citadas anteriormente: Lívia Torres, então repórter dos jornais locais do Rio de Janeiro, foi dispensada por comandar um evento da CBF.
Desde então, outros profissionais — inclusive medalhões — do telejornalismo da maior emissora do país voltaram a violar as regras de conduta da companhia: Mônica Waldvogel, que fez dupla com Tiago Eltz na bancada do Em Ponto, fez propaganda de sapatos de uma grife paulistana no final de janeiro, quando estava apresentando o Edição das 18h. Foi advertida, mas não perdeu o emprego. Silvana Ramiro, âncora de telejornais locais no Rio, foi repreendida por conta de palestras ministradas para funcionários de um banco. Ambos os casos aconteceram neste ano.
Mônica, Eltz e Silvana foram advertidos, mas tiveram seus empregos e funções poupadas, escapando de sanções mais sérias. A passada de pano, segundo apurou a reportagem do TV Pop, não caiu bem na Redação da emissora em São Paulo. Não foram poucos os profissionais que se indignaram com mais uma violação dos Príncipios Editoriais passando praticamente impune — e ela teria passado em branco se não fosse o contato do site, que procurou a assessoria de imprensa da Globo no início da tarde de domingo.
O que diz a Globo?
Consultada pelo TV Pop, a emissora enviou uma nota se manifestando sobre a infração de Tiago Eltz na tarde desta segunda. “A Globo não comenta casos específicos, mas enfatiza que nossos jornalistas não devem ter envolvimento com marcas. Podemos adiantar que o caso já foi analisado internamente e o post foi retirado do ar”, diz o comunicado oficial do canal.