A repórter que escreve esse texto trabalhou no SBT quase cinco anos e, na tarde desta quinta-feira (31), ficou sabendo que o Bom Dia & Cia iria acabar. A partir daqui, escrevo tudo de maneira pessoal. São as minhas experiências e lembranças. Uso desse espaço que construí como radialista para contar um pouco de como me sinto.
Com 27 anos de idade, a emissora de Silvio Santos manteve no ar um programa por mais tempo do que eu estou viva e deste site veio a notícia de que o mesmo iria acabar. Talvez você não saiba, mas trabalhar no SBT é uma grande gangorra e, como boa radialista, eu sempre gostei de emoção. Nunca acreditei muito nesse negócio de estabilidade – principalmente na TV – e, trabalhar no SBT (de 2014 a 2018), reafirmava isso. Você nunca sabe qual será o próximo passo do acionista, mas uma certeza sempre pairou sobre nós (o famoso chão de fábrica): os programas das filhas não tem mudanças (explicando didaticamente: não possuem grandes alterações como demissões em massa). Engraçado lembrar disso já que também era comum ouvir que as equipes que trabalhavam nesses programas sempre seriam “mantidas”.
Enquanto ainda era estagiária no canal, tive a chance de ser por um dia a “Dona Coelha” do Bom Dia & Cia (sem vergonha alguma e guardo com muita honra esse dia divertido para uma jovem de 19 anos). Estive naquele switcher durante anos assistindo cada passo de uma equipe extremamente competente e cheguei até a ser “expulsa” (leia isso sem nenhuma mágoa) do local porque “não poderia ter pessoas de fora (do jornalismo) assistindo”. Foi no Bom Dia & Cia que eu aprendi a colocar videografismo (tarjas ou GC, como preferir) na tela, por exemplo. Foi naquele programa que eu aprendi a operar um VT. Aprendi com os técnicos da engenharia o que era necessário se algo desse errado.
Trabalhar em televisão (na parte operacional) é um pouco de fazer todos os dias as mesmas coisas até que algo dê problema. Imagine que você espera o tempo todo pelo pior? Trabalhar ao vivo é mais ou menos assim e até tinha um pouco de emoção como a mesa de corte travando, o Lucas do ar ou alguma vinheta que não entrou, mas no programa infantil matinal a minha memória sempre se lembra de um conforto em fazer o trabalho, a equipe nunca me transpareceu ter o medo que outras equipes tinham ao fazerem o que eram pagas para fazer.
Eu vi pessoas serem demitidas, o Notícias da Manhã trocar de apresentador e depois acabar, os boletins, o Triturando, Fofocando, a estreia do Primeiro Impacto e as mudanças no jornal, vi o Jornal do SBT acabar, vi o SBT Notícias surgir, vi cada apresentador sendo contratado e também vi cada programa acabar, vi pessoas chorando nas redações, vi pessoas comemorando uma promoção, vi funcionários terem medo do que poderia acontecer. Foram muitas mudanças e nem consigo lembrar de todas.
Recebo com tristeza o fim de um programa que estava há 28 anos na grade. Talvez até seja um pouco de apego emocional por todos os anos em que estive ali e que cresci assistindo. No Bom Dia & Cia eu enxergava grandes profissionais que criavam de maneira lúdica um programa infantil e tentavam criar o máximo de coisas possíveis com o mínimo que tinham. A responsabilidade de se trabalhar com crianças na era da internet é muito grande. O melhor sonoplasta (aquele cara que coloca as músicas) que já conheci em minha vida, trabalhava ali. Um dos melhores diretores de TV que eu conheci, trabalhava naquela equipe. Um dos câmeras que mais admiro e respeito, trabalhava naquela equipe (digo “trabalhava” por não ter mais contato com as pessoas). Uma das estagiárias que carrego como uma amiga, eu conheci nos bastidores.
Longe de mim tentar entender ou julgar onde o calo de cada um aperta e muito menos quero apontar o que um empresário deve fazer com sua própria empresa, mas sinto – imensamente – pelo impacto da audiência ruim que o SBT vem vivenciando. Sinto mais ainda pelas grandes tentativas de mudanças que ainda estão por vir – elas sempre vem. Sinto pelas equipes que não sabem o que vai ao ar amanhã e muito menos na semana que vem. O fim do Bom Dia & Cia não é de se comemorar. É para se preocupar.