Pesquisar
Pesquisar
Close this search box.

Por que a notícia da venda da Globo poderia ser verdadeira?

Fachada da Globo com o novo logo da empresa: companhia vendeu a Som Livre por cerca de R$ 2 bilhões (foto: Reprodução/Redes Sociais)
Fachada da Globo com o novo logo da empresa: companhia vendeu a Som Livre por cerca de R$ 2 bilhões (foto: Reprodução/Redes Sociais)

No último sábado (13), o Correio da Manhã, desconhecido jornal liderado pelo jornalista Claudio Magnavita, surpreendeu a todos com a notícia da possível venda do Grupo Globo para a J&F, holding liderada por Joesley Batista e controladora de marcas como a JBS (Friboi, Seara, Swift, Massa Leve), PicPay, Banco Original, Eldorado Celulose, Âmbar Energia, dentre outras que reúnem mais de 250 mil funcionários e presença em 190 países.

A notícia rapidamente se espalhou e, embora tenha partido de um veículo de baixíssima expressividade (o Correio da Manhã foi um periódico de grande renome no século XX mas que parou de ser publicado em meados dos anos 70, tendo seu nome resgatado por Magnavita em 2019), a Globo se apressou em negar e mobilizou sua assessoria de imprensa ainda na manhã de sábado (13). O grupo também se valeu de seus veículos de maior credibilidade, como o Valor Econômico, lido e reconhecido pelo mercado financeiro.

Independente de a venda ocorrer ou não, o modus operandi de se negar é comum no mercado. O Grupo RBS, parceiro da própria Globo, recorreu ao mesmo expediente em 2016: quando o jornalista Paulo Alceu anunciou que o grupo estaria se desfazendo das operações de Santa Catarina, um comunicado da matriz gaúcha veio à tona negar um evento que se concretizaria um mês depois. Claro que as proporções são totalmente incomparáveis, mas, caso houvesse uma venda, ela deveria ser encarada como uma surpresa diante dos desafios que a Globo encontra para o futuro.

Capital: a Globo, como qualquer empresa, precisa de capital para operar (pagar suas contas do dia-dia, como funcionários e fornecedores) e para investir, gerar receita, lucros, remunerar seus acionistas e seguir o fluxo que qualquer empresa segue.  Até cinco, dez, quinze anos atrás, os maiores concorrentes da Globo eram Record, SBT e Band. Concorrentes mais que conhecidos e que, salvo em raríssimas ocasiões, não demonstravam medo. O cenário mudou e a concorrência passou a ser global, por empresas como Netflix, Amazon e Disney.

A Globo faz conteúdo brasileiro como ninguém, mas é importante ressaltar alguns parâmetros que tornam a disputa muito desigual: para modernizar seus estúdios, adquirir equipamentos de ponta, rechear o Globoplay com filmes e séries estrangeiros e tornar sua plataforma atraente para o consumidor brasileiro, a Globo gasta em dólar – que está em quase R$ 6. Mas sua receita é toda em reais.

Diferente de seus concorrentes, que foram capitalizados a vida inteira em dólar – o mesmo dólar que está em R$ 6. A receita, por enquanto, pouco importa: uma Amazon, que faturou em 2020 US$ 386 bilhões, tem capital suficiente para queimar no Brasil – e o faz, brincando com estratégias agressivas, como o combo Amazon Prime Video, somado a Frete Grátis, ebooks liberados e milhões de músicas por apenas R$ 9,90 por mês. Esse desequilíbrio, fruto da globalização, já faz a Globo ter saudades das brigas que tinha com o SBT e Record.

Balanços: nos últimos anos, as operações de mídia vêm performando muito mal no Brasil. A Abril, antiga gigante do impresso, não é mais sombra do que já foi um dia. O SBT alterna entre lucros e prejuízos – mas mesmo quando lucra, lucra pouco pelo que movimenta. Em 2017, o lucro foi de R$ 38 milhões para um faturamento de R$ 1 bilhão – uma margem de 3,8%, que se linear até poderia ser interessante para alguns investidores.

Record, Band e RedeTV! têm forte dependência de conteúdo religioso – as duas últimas, além dos religiosos, de outros programas terceirizados. A TV em si deixou de ser rentável pelo que ela se propõe: o conteúdo com objetivo de entreter e informar. E isso pode sim, viabilizar, uma abertura de capital da Globo, como também de suas concorrentes em prol da sobrevivência.

Jornalismo: antes de se falar de Jornalismo, é preciso regressar ao dia 17 de maio de 2017. Esse dia ficou registrado na história do mercado financeiro como o Joesley Day. Foi nesse dia em veio à tona, por meio do jornalista Lauro Jardim, do jornal O Globo, a revelação de que Joesley Batista, gravou o então presidente Michel Temer dando aval para a compra do silêncio de Eduardo Cunha. “Tem que manter isso, viu?”, foi a frase dita por Temer para simbolizar que a mesada deveria ser contínua.

A movimentação de delação premiada ganhou proporções gigantescas na mídia. Segundo a Forbes, apenas naquela semana, a família já havia perdido mais de R$ 4 bilhões com a queda das ações ocasionada pela repercussão.

Ainda que empresas de mídia não tenham grandes faturamentos, o poder que elas possuem é gigante. Uma empresa como a Globo sequer está no top das 30 empresas de maior receita do Brasil – o jornal O Globo, de onde a notícia saiu, sequer no top 100 estaria – mas a influência que exercem é muito grande no mercado a ponto de movimentar bilhões. Uma concessão a um grupo, qualquer que seja e ainda que em uma sociedade, poderia ameaçar a liberdade editorial da Globo.

Em qualquer movimentação de venda, sociedade ou repartição, o jornalismo seria visto como a joia da coroa. Para isso, haveria duas possibilidades: a primeira seria de uma comercialização de ações em até 49%, mantendo o poder à família Marinho mas permitindo a injeção de novo capital para sustentar investimentos; a segunda seria de criação de subsidiárias – Globo Novelas, Globoplay, Globo Entretenimento e Globo Jornalismo, de forma que todas pudessem ser fracionadas no mercado e o jornalismo mantido totalmente sob poder da família Marinho.

João Gabriel Batista é publicitário, com pós-graduação em Marketing and Sales na Escola de Negócios Saint Paul e MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Tem 29 anos e atua com marketing há 11, com passagens por veículos de comunicação, como emissora de TV, rádio e jornal, e multinacionais do segmento de telecom. É analista de mercado e negócios no TV Pop, com publicação nas terças. Converse com ele por e-mail em [email protected]. Leia aqui o histórico do colunista no site e conheça o seu perfil no Linkedin.

Leia mais