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MAIS UMA BAIXA

Chico Pinheiro se demite da Globo e deixa comando do Bom Dia Brasil

Chico Pinheiro em sua última aparição no Bom Dia Brasil
Chico Pinheiro terá ano sabático longe da televisão (foto: Reprodução/TV Globo)

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Chico Pinheiro não é mais apresentador do Bom Dia Brasil: titular das manhãs da Globo há mais de uma década, o jornalista decidiu se afastar da televisão e terá a sua saída anunciada pela líder de audiência ainda nesta sexta-feira (29). A equipe do telejornal já foi alertada sobre a saída do âncora, que tem dito para amigos próximos que planeja ter um ano sabático, distante das câmeras e sem se envolver com outros veículos de comunicação. Ele já não apresentava o telejornal há quase duas semanas, desde a manhã de 15 de abril. A possibilidade do desligamento do comunicador foi antecipada pela coluna de Flávio Ricco, publicada no portal R7.

Em um extenso e-mail enviado para a Redação do Rio de Janeiro no início da manhã desta sexta, Ali Kamel oficializou a saída do jornalista, que trabalhava na empresa há 26 anos ininterruptos. A tendência é de que, em um primeiro momento, Chico Pinheiro não seja substituído na bancada do Bom Dia Brasil — o telejornal tem sido comandado desde a saída do âncora, inicialmente longe do telejornal para se dedicar ao Globeleza, só por Ana Paula Araújo. Desde o início da semana, com a titular deslocada para o Jornal Nacional, o matinal tem sido feito por Ana Luíza Guimarães.

Essa é a segunda baixa relevante no departamento de Jornalismo da Globo em apenas uma semana: há três dias, a emissora dispensou os serviços de Carlos Tramontina após de 43 anos, 24 deles na bancada da segunda edição do SPTV. A saída, anunciada pelo canal como um acordo costurado entre as duas partes, não foi tão amigável assim. A reportagem do TV Pop apurou que ele não planejava se aposentar e que estava empolgado por ter voltado ao comando do telejornal em setembro do ano passado, após quase dois anos afastado por culpa da crise sanitária.

Assim como o colega, Chico Pinheiro já estava em negociações avançadas para a dissolução de seu contrato há alguns dias: ele, no entanto, pediu aos diretores para permanecer contratado até o final da cobertura do Carnaval. Assumidamente amante das artes, o comunicador sempre se destacou na narração dos desfiles das escolas de samba de São Paulo e chegou a ter um programa de cultura na GloboNews, destinado ao universo da música popular brasileira, o Sarau. No entanto, diferentemente de Tramontina, a sua saída não é exatamente uma surpresa.

Há pouco mais de dois meses, Pinheiro foi duramente repreendido pela diretoria da Globo por conta de um comentário durante o Bom Dia Brasil, interpretado internamente como uma defesa da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. Para alguns membros da alta cúpula da emissora, o jornalista sequer deveria ter sido reintegrado ao comando do matinal depois de seu afastamento — ele nunca teve uma boa relação com Ana Paula Araújo, e os dois passaram a acumular desentendimentos poucos dias depois da volta do veterano ao trabalho presencial, em julho de 2021.

Antes de seu comentário em fevereiro, Pinheiro havia recebido apenas uma ordem clara de seus chefes: não se envolver, em hipótese alguma, em política. Nem mesmo em rodinhas de amigos, como já aconteceu antes. E isso justamente pelo episódio do áudio em defesa do ex-presidente Lula, vazado em aplicativos de mensagens pouco depois do jornalista ter apresentado a edição do Jornal Nacional que foi ao ar no dia da prisão do político. Boa parte da diretoria da Globo defendia que ele tivesse sido demitido já nesta época. No entanto, pesou o receio de que a sua demissão pudesse representar um eventual posicionamento político da companhia, e não uma sinalização de que a empresa é isenta editorialmente.

A reportagem do TV Pop teve acesso ao e-mail interno enviado por Ali Kamel sobre a saída de Chico Pinheiro. Confira a íntegra do texto:

Chico Pinheiro conquista de imediato o público em casa e seus colegas no trabalho com duas características marcantes: a língua afiada contra as mazelas do Brasil e uma simpatia contagiante. Este mineiro, cujo amor pelo jornalismo só encontra paralelo na paixão pelo Galo, não é mineiro. Nasceu em Santa Maria da Boca Monte, cidadezinha do Rio Grande do Sul. Mas foi criado em Minas Gerais, conquistou o coração dos paulistas e fez grandes amigos no Rio. Para nossa sorte, desistiu do curso de engenharia na UFMG depois de quatro anos e se formou em jornalismo na PUC-MG em 1976 (mas já estagiava em redações desde 1971, primeiro no Diário de Minas e, depois, na sucursal mineira do Jornal do Brasil). Em 1977, veio para a Globo Minas como chefe de reportagem a convite de Eduardo Simbalista, com quem trabalhara no JB. Inquieto, foi para Navarra fazer uma pós-graduação e, na volta, tornou-se repórter em Belo Horizonte do Jornal Nacional. Fez entrevistas de que se orgulha: entre muitas, com Doutor Ulysses Guimarães e o então ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel, essa última censurada pela ditadura militar.

A mudança para São Paulo foi em 1989 para apresentar o Jornal da Band, o carro-chefe da emissora. Lá foi premiado pela cobertura do impeachment de Fernando Collor e ancorou os principais telejornais da Band até 1995. O retorno à Globo, em 1996, foi como apresentador do Bom dia São Paulo, com participação no Bom dia Brasil, e os plantões na bancada do JN. Logo depois, Chico conquistou os corações paulistanos no SPTV – uma bancada onde brilhou por 13 anos.

Dessa época, se destaca a entrevista histórica com Niceia Pitta, ex-mulher do então prefeito Celso Pitta, sucessor de Paulo Maluf. Niceia revelou para Chico as entranhas do esquema de corrupção e pagamento de propina na prefeitura numa reportagem exibida num Globo Repórter especial sobre o caso.

Chico é sempre atento a causas sociais. Na Globo, desenvolveu o movimento “Sou da Paz”, pelo desarmamento, que se transformaria depois no instituto de mesmo nome com forte influência no que viria a ser o Estatuto do Desarmamento. É também conselheiro do movimento Todos Pela Educaçao e do Instituto Ayrton Senna. Graças ao trabalho no jornalismo comunitário da em SP, recebeu o título de Cidadão Honorário da capital paulista. Depois, foi agraciado com o título de cidadão honorário de Águas de Lindóia, terra de sua mulher, a jornalista, Leda Rielli, nossa colega, terra onde pretende viver um dia.

Chico cobriu as visitas ao Brasil dos Papas João Paulo II, Bento XVI e seu xará Francisco. Dessa última, tenho uma lembrança muito afetuosa, pois fui testemunha do carinho que sempre teve pelo pai, seu Antônio, católico fervoroso que gostaria de receber uma benção de Francisco. O Papa receberia convidados de pessoas ligados de alguma forma aos organizadores da Jornada da Juventude, que a Globo apoiou. Era tudo muito restrito, mas o empenho de Chico era tão comovente que consegui um convite para o seu Antônio. Ocorre que Chico estava preocupado com o bem-estar do pai, já idoso, que chegara muito cedo ao Palácio São Joaquim. Apesar de saber que ele seria bem cuidado, Chico não não conseguia descansar: queria estar por perto para cuidar do pai, algo quase impossível, mesmo para ele. De repente, quando olho para o lado, lá estava Chico, ao lado do pai. Como ele entrou? Ele gosta de dizer que fez como a água, que sempre encontra um caminho por onde passar.

Em sua trajetória, entrevistou grandes nomes das artes no Espaço Aberto da Globonews, como Dona Ivone Lara, Zeca Pagodinho, Paulinho da Viola, Beth Carvalho, Walmor Chagas, Nathalia Timberg e tantos talentos dos palcos. Dessa experiência, nasceu o Sarau, programa que é ainda hoje um dos maiores arquivos de gênios de nossa música, entrevistados com habilidade, elegância, deixando sempre o convidado se sentindo em casa.

A competência e a popularidade trouxeram Chico para o Rio em 2011, para assumir a bancada no Bom Dia Brasil. Chico já participava do programa entrando de São Paulo e passou a ancorar o telejornal, primeiro ao lado de Renata Vasconcellos e depois de Ana Paula Araújo. No Bom Dia, cobriu eleições presidenciais no Brasil, as manifestações de 2013, Copas, Olimpíadas, guerras, desastres e tudo mais que tenha sido notícia nesses onze anos.

Sem perder o sotaque mineiro nem o bom humor, Chico saúda o início das semanas com um entusiasmado “Coragem!”! E a chegada do fim de semana com “Graças a Deus, hoje é sexta-feira”. Este carisma transborda para a equipe, que sempre para, atenta a suas histórias.

Depois de 51 anos de jornalismo diário, 32 deles na Globo, em comum acordo com a emissora, Chico decidiu deixar o dia a dia da vida de repórter, como ele faz questão de se definir. Pretende se dar um sabático e, mais adiante, se dedicar a atividades num ritmo mais espaçado. E combinou comigo que esperaria o fim de mais uma brilhante transmissão do Carnaval, a que se dedica há vinte anos, para que esse anúncio fosse feito, numa sexta-feira. Talvez para poder dizer com força o seu bordão, cuja origem, apesar do significado mais ligeiro, ele explicou assim, numa entrevista: “As pessoas me perguntam por que eu digo isso, me perguntam se eu não gosto de trabalhar. O motivo na verdade é outro. Na sexta, a gente cumpriu o dever, a gente navegou pela vida durante a semana, conhecendo coisas, aprendendo coisas e procurando melhorar. E sexta-feira, claro, é o começo de estar mais com os amigos, de estar mais relaxado e de se sentar à mesa para partilhar o que foi vivido durante a semana com o companheiro, aquele com quem como o pão, aqueles com quem divido a minha mesa. Essa alegria do encontro, em geral, acontece na sexta-feira”.

De nós, seus colegas e amigos, fica o reconhecimento de ter convivido na redação com um dos grandes jornalistas que a televisão brasileira já produziu e uma das pessoas “boa gente” com quem já compartilhamos histórias e experiências.

Entre mim e Chico fica carinho e amizade, e muitas sextas feiras por vir.

A ele, agradeço em nome da Globo por toda a contribuição que deu ao nosso jornalismo.

Ali Kamel

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